segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Jogos de guerra como ferramenta imperialista



É, no mínimo, intrigante como as mídias das mais diversas glamourizam a nossa cultura bélica. É uma temática muito presente dentro da indústria cultural. Nos videogames é figura cativa desde sua criação, já que o seu surgimento, enquanto dispositivo eletrônico, está associado à tecnologia militar. Muitos jogos se debruçam nessa linha narrativa, sem problematizá-la. É a guerra como mercadoria e, acima de tudo, como entretenimento.


Nos Estados Unidos, a popularidade de jogos com essa temática tem explicação histórica. A construção da identidade nacional de lá se relaciona com os conflitos que o país participou ou investiu. É como se a guerra fosse um elemento unificador, constituindo parte do que é “ser” estadunidense. Não à toa, jogos como Call of Duty fazem um imenso sucesso na terra do tio Sam. 


Boa parte desses jogos fomentam a ideologia neoliberal que coloca as Forças do “exército ocidental” como as guardiãs dos valores democráticos. Geralmente, a narrativa é maniqueísta e reforça estereótipos. A causa imperialista, que funciona como a real motivação para os conflitos, é deixada de lado, propositalmente. E a ideia de entretenimento esvazia o impacto desses discursos, nos alienando do seu real sentido e as contradições do mundo capitalista.


Poucos são os títulos, com foco nessa temática, que conseguem humanizar as mensagens de suas narrativas, tornando-as mais sensíveis ao jogador. No geral, o que vemos é a construção de um sentido positivo para o conflito. Morte e guerra viram mercadorias, que tem a finalidade de nos entreter. Sob essa lógica, os jogos de guerra acabam se tornando uma ferramenta de alienação, que propaga o discurso imperialista e justifica atrocidades como as que Israel vêm fazendo com a Palestina, por exemplo.


quarta-feira, 3 de setembro de 2025

O choro do gamer anti-woke

O início do século XX é marcado pela massificação da cultura através de veículos de comunicação, como a TV e o rádio. O sentido revolucionário da ideia de massa, defendido pela corrente marxista, ganhou uma conotação negativa. Assim, aquilo que é massificado, é uniformizado e desprovido de crítica, algo que está a serviço do sistema capitalista. Quando falamos de “cultura de massa”, portanto, estamos nos referindo a algo que não é dotado de reflexão.

Entreter ou refletir? 

O filósofo da escola de Frankfurt, Walter Banjamin, acredita que o cinema teria a capacidade de reunir divertimento e reflexão crítica, contrapondo-se à ideia de “cultura de massa”. O rótulo de videogame como arte é um fenômeno recente e ganhou contornos mais abrangentes quando suas narrativas ficaram mais “cinematográficas”. Não que os primeiros jogos não fossem dotados de narrativas ou fossem menos artísticos. Mas, os discursos presentes eram muito mais sutis. De toda forma, acredito que a lógica de Walter Benjamin pode se aplicar a essa mídia.

Nas primeiras gerações de consoles, os videogames estão muito associados à ideia de mercadorias, um produto que possui um fim bem específico: o entretenimento. Essa ideia acabou por cristalizar na mente dos jogadores um papel de mão única que os jogos deveriam cumprir. Uma mercadoria, como qualquer outra, em que a grande massa, de forma quase que uniforme, poderia consumir enquanto se entretém. É bom frisar esse “quase”, porque mesmo levando em consideração o papel mecânico e técnico do videogame - e ignorando sua narrativa e contexto - as experiências são singulares. 

Essa fase inicial representa, de certo modo, a infância desses produtos. Só que, ao longo do tempo, eles foram passando por um processo de maturação. Contando com narrativas mais complexas, abordando muitas vezes assuntos importantes, como política, representatividade, transtornos psicológicos etc. Porém, esse amadurecimento, nem sempre foi bem recebido por parte do público “gamer”. Para esses jogadores, mais vale aquela visão inicial que associava os jogos única e exclusivamente à lógica do entretenimento.

Um convite ao debate político 

Entreter, nesse sentido, é se distrair. Uma forma que encontramos de nos deslocarmos da realidade. É no ócio que, depois de um exaustivo dia de estudo ou trabalho, reabastecemos nossas energias. Isso para estarmos minimamente aptos ao nosso ofício no dia seguinte. Isso coloca o entretenimento como uma extensão do trabalho. Uma ferramenta que serve, unicamente ao sistema e a lógica de produção do mercado, já que o seu fim é nos alienar do mundo à nossa volta. 

Qualquer debate mais reflexivo sobre o papel dessas mídias, que fujam a ideia de entretenimento, não são tolerados. A palavra “Woke”, utilizada por alguns para atacar debates políticos acerca da representatividade, é, na verdade, um chamado para a pessoa “acordar” para o mundo e seus problemas. Um termo antes associado à luta da comunidade negra estadunidense, contra o racismo, mas que passou a abranger debates com vistas à consciência política e social. 

O cinismo anti-woke

A galera “anti-woke” dos videogames, ao qual carinhosamente chamo de “gamer reacionário”, são pessoas que permanecem descoladas da realidade. Eles não enxergam os problemas sociais e acreditam que há excesso desses debates dentro do campo progressista. Assim, os videogames seriam apenas um produto que tem como norte o entretenimento, não a problematização da realidade. O cômico disso tudo é que essa é uma visão cínica, porque o choro e revolta deles não é sobre o debate em si, mas sobre o que se é debatido.


segunda-feira, 1 de setembro de 2025

A indústria de jogos ainda respira com Hollow Knight: Silksong

Um gênero de videogame que foi grande expoente nos anos 80 e 90, foram os de jogos de plataforma 2D. Títulos dos mais diversos, como Super Mario, Mega Man, Contra, foram lançados misturando ação, aventura, tiro e por aí vai. São jogos simples, com um saudoso visual pixelado e que marcaram demais o início da geração de consoles. 


Três jogos, em especial, revolucionaram o gênero, em momentos diferentes: Metroid, Super Metroid e Castlevania: Symphony of the Night. A busca pela maior pontuação, os estágios cronometrados e a linearidade das fases foram deixados para trás. Elementos de exploração foram adicionados à esses jogos, dando liberdade de progressão para os jogadores. Nesse sentido, as fases com início, meio e fim, deram lugar a um grande labirinto interconectado.




Metroid + Castlevania = Metroidvania



O avançar por certas áreas estava ligado a uma habilidade ou poder específico. O que tornava o ir e vir pelos cenários uma coisa constante. Assim, se perder por aquele mundo era muito fácil e, de certa forma, algo que fazia parte da experiência. Com Castlevania, elementos de RPG foram adicionados. E a narrativa ficou, ligeiramente, mais envolvente, apesar de piegas.


Jogos que traziam consigo a mistura de elementos e mecânicas, de Metroid e Castlevania, ficaram conhecidos como Metroidvania. Na sexta geração de consoles, no entanto, em meio ao “boom” dos jogos tridimensionais e com narrativa cinematográfica, o subgênero passou a respirar por aparelhos, sobrevivendo graças ao poder de portáteis, como o Game Boy Advance. 


Surge Hollow Knight



Nos anos seguintes, a popularização de estúdios independentes teve um grande papel no resgate e manutenção do legado dessas obras, nos consoles de mesa e PC. Um dos maiores expoentes foi, justamente, um jogo despretensioso, de um pequeno estúdio australiano chamado Team Cherry. Trata-se de Hollow Knight.


Fruto de um financiamento coletivo, no kickstarter, Hollow Knight teve o seu desenvolvimento iniciado em 2014. Lançado em 2017, ele foi cativando, pouco a pouco, os corações dos jogadores. Sucesso de crítica e de vendas (mais de 15 milhões de cópias, desde o lançamento), o título abriu caminho para o resgate dos Metroidvanias, mostrando que há espaço na indústria para jogos do tipo. 


A narrativa não segue uma linearidade. O arco do pequeno herói é contado de forma fragmentada, através de nossa interação com os outros personagens de Hollownest (o mundo do jogo). Quanto mais nos debruçamos e exploramos aquele mundo, mais aprendemos sobre ele. 



A trilha sonora e o design de som, são espetaculares. De você saber exatamente sua localização no mapa pela melodia tocada. É tudo tão incrível que até mesmo os “voice acting” são marcantes e nos fazem associar, imediatamente, ao personagem em questão. Como o gritinho de Hornet ou o arfar desinteressado de Iselda, a lojista de Dirtmouth.


O visual, desenhado à mão, é lindíssimo. Os controles são precisos e simples. Porém, vão ganhando camadas de complexidade conforme avançamos e novas habilidades são desbloqueadas. O jogo é muito honesto quanto à dificuldade. É desafiador na medida certa. Nada mais absurdo compará-lo aos soulslike da vida.


Hollow Knight brilha também nos bastidores. Todo o processo de desenvolvimento se deu envolto a muito respeito aos profissionais envolvidos e aos fãs que financiaram o projeto. São conteúdos extras que foram adicionados de forma gratuita e um trabalho contínuo de otimização.

 

Silksong não é meme



Dado o sucesso, uma expansão da história foi prometida para os fãs. Mas, o projeto ficou tão grande e audacioso que se tornou um jogo completamente novo. E é aí que Hollow Knight: Silksong entrou na brincadeira. Desde o seu anúncio, em 2019, porém, pouco se soube sobre o título, rendendo memes dos mais diversos, nas redes sociais. O silêncio, finalmente, foi quebrado na última Gamescom. Depois de anos de espera Silksong ganhou uma data de lançamento: 04 de setembro. 


A falta de informação, em todos esses anos, acendeu um alerta de que o jogo passava por um algum tipo de problema no processo de desenvolvimento. O temor era de que a demora se devia à uma crise criativa ou algo do tipo. Porém, foi justamente o oposto. O caminhão de novas e boas ideias, e a vontade de torná-lo ainda melhor, é que esticou o seu desenvolvimento. Os caras da Team Cherry, literalmente, estavam se divertindo criando o jogo. 


A indústria ainda respira


A galera costuma dizer que o “background” narrativo por trás de um jogo pode torná-lo ainda mais memorável. Em meio a tantas notícias ruins na indústria (crunch, abuso, demissões em massa) a história por trás do desenvolvimento de Silksong é um alento. Um sopro de esperança que aponta que não só os metroidvanias ainda “respiram”, mas a indústria como um todo.


quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Será que um dia os jogos 3D do Sonic serão, realmente, incríveis?


 Apesar de entender a importância e relevância para a indústria dos jogos 3D do Sonic, não vejo com bons olhos a transição para esse mundo. Ainda sinto saudade da simplicidade das primeiras aventuras. Do ouriço azul gordinho e silencioso e, claro, dos jogos que mesclavam de forma sublime momentos de plataforma e velocidade. 


A entrada no mundo 3D


Sonic Adventure foi um divisor de águas. O design do personagem foi retrabalhado, sintetizando o que a nova aventura se propunha a fazer. Sonic passou por uma “harmonização facial”, botou lentes verdes, pegou pesado na dieta para perder o calo na barriga e aprendeu a falar. Metade da simpatia, certa inocência e charme do personagem, pra mim, se perdeu nessa decisão estética que flertava com o “radical”.


É até estranho pensar nisso, em retrospecto, porque pra quem tem menos de vinte e cinco anos, esse é “O” Sonic. Só que o personagem das aventuras tridimensionais nunca me cativou. E a qualidade duvidosa de seus jogos 3D - em comparação às aventuras dos áureos tempos do Mega Drive - contribuiu para isso.


A ironia disso tudo é que antes os títulos de Sonic foram pensados para rivalizar com os jogos do Super Mario. E hoje em dia, Sonic rivaliza com ele mesmo. Não à toa um dos maiores sucessos recentes do personagem nos videogames foi o jogo celebração Sonic Mania, do já distante ano de 2017. Um título nostálgico que resgata toda a magia das aventuras da geração 16 bit.


Jogos tridimensionais de destaque


Se nos cinemas Sonic finalmente conseguiu alcançar o sucesso que merece, na sua mídia de origem continua “batendo cabeça”. Mesmo assim, entre muitos erros e alguns acertos, consigo destacar três jogos tridimensionais do ouriço azul que merecem atenção: Sonic Frontiers, Sonic Colors e Sonic Generations. Não são jogos incríveis, mas estão longe de “tosquices” como Sonic The Hedgehog, de 2006. 


Desses, Sonic Generations é o meu preferido. O título, lançado em 2011, originalmente, celebrava o vigésimo aniversário do personagem e uniu de um jeito bem interessante a fase 2D e 3D do ouriço, resgatando inclusive o Sonic gordinho dos primeiros jogos. A história de Generations nos permitiu revisitar estágios de diferentes momentos da franquia, apresentando fases retrabalhadas e novos mixes de composições clássicas.


Em 2024, o jogo foi relançado para os consoles atuais e adicionou o personagem Shadow na brincadeira. Uma clara jogada de marketing para promover o filme Sonic 3, que estava em vias de estrear nos cinemas. Sonic X Shadow Generations, é um divertido choque de gerações e consegue  agradar tanto fãs de longa data, quanto os mais jovens.


Na espera de um jogo, realmente, maravilhoso


De toda forma, por tudo que vi até agora e tendo crescido jogando os títulos do ouriço azul, me causa certa frustração a SEGA não conseguir emplacar um jogo, realmente, maravilhoso. Queria mais, muito mais! Não me refiro a sucesso comercial. Até porque, Sonic Frontiers é considerado, nesse sentido, um sucesso. 


Queria aquele jogo de plataforma 3D que chama atenção da galera e que deixa todo mundo de boca aberta, por tamanha beleza e criatividade. Algo que a Nintendo faz com maestria, como as aventuras de Super Mario e, mais recentemente, Donkey Kong Bananza. Queria algo épico como Psychonauts 2 e divertido como Astro Bot. Será que um dia Sonic chega lá? Sigo aqui na torcida.

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Luto e arte em Clair Obscur: Expedition 33

Clair Obscur: Expedition 33 se tornou um fenômeno. Lançado em abril deste ano, o jogo foi uma grata surpresa. Títulos de RPG por turno, se tornaram muito nichados. E um dos grandes méritos de Clair Obscur é conseguir, justamente, furar essa bolha. Ele sintetiza e se inspira em elementos de diversos jogos existentes: um pouco de Persona, Final Fantasy, até mesmo jogos da série Souls. A equipe por trás do desenvolvimento, a Sandfall Interactive, carrega nomes experientes da indústria, que já trabalharam, em outros momentos, para grandes empresas como a Ubisoft. 

Tendo vendido mais de 3 milhões de unidades em pouco mais de um mês, é seguro dizer que Clair Obscur é um sucesso avassalador. Ele surpreendeu a todos, principalmente por não estar vinculado a uma grande publisher, apesar do investimento ter sido pesado. Mas, aqui não me interessa as entrelinhas acerca do desenvolvimento do jogo e sim o discurso presente em sua narrativa. Nesse quesito, Clair Obscur: Expedition 33 é tão brilhante quanto. A trama é envolvente e muito bem trabalhada. A trilha sonora, por sua vez, amplifica a carga emocional que o roteiro entrega para o jogador. Um espetáculo!

Morte e luto


Grosso modo, podemos enxergar dois grandes temas, que abrem o leque para outros subtemas na jornada dos heróis por Lumiére, o mundo fictício do jogo. O primeiro está presente desde o início: a morte e o luto. Como cada pessoa lida com isso? No jogo ano após ano, uma entidade, conhecida como artífice, pinta uma idade num monólito (a começar por cem) de forma regressiva. E todos aqueles com idade maior do que a pintada, desaparecem em meio a pétalas de rosas, sem dor ou sofrimento. Só deixam de existir.


Diante da morte iminente, os moradores de Lumiere passaram a organizar expedições para tentar evitar o arrebatamento, chamado por eles de “goomage”. No jogo fazemos parte da Expedição 33, que dá nome ao título. A certeza da morte iminente mudou a forma como eles encaram a própria vida. O interessante aqui é que nem todos concordam com as expedições. Mas, há respeito mútuo e cada um vive o tempo que lhes resta da melhor forma possível. Jovens amadureceram e passaram a constituir família cada vez mais cedo. E, acima de tudo, a certeza do fim os tornaram mais empáticos. Viver a  vida se tornou algo muito mais intenso porque, mais do que nunca, ela é curta.


Todos os moradores da ilha lidam com a perda de alguém que já amaram. E a dor os uniu. A ideia do luto vai ganhando mais camadas, com o avançar da história. Isso porque no início temos a perspectiva dos moradores de Lumiére. Mas, novos personagens são adicionados, quando a Expedição 33 chega ao continente, e um novo viés é apresentado. Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. De todas as fases do luto, a mais difícil, na minha opinião, é a aceitação. E existe todo um arco narrativo que demonstra o quão difícil é se acostumar com a dor da perda. E isso ronda a história do jogo até o seu desfecho.

O poder criativo da arte


O segundo tema presente no jogo é mais sutil. Trata-se do debate sobre a ideia de “arte”. Existe toda uma trama de uma família de artistas que vive no continente. Sem entregar muito das surpresas que Clair Obscur trás, é interessante a forma como podemos perceber a existência de vida na arte. Arte é um retrato da realidade, o olhar do artista sobre ela. Uma força criativa em que, diante da finitude de nossas vidas, podemos brincar de deus. Em certo momento isso entra em debate, nos fazendo questionar a noção de realidade.

Se nos debruçarmos sobre a noção de arte, veremos algo ligado à concretização de uma ideia ou a expressão de nossa própria subjetividade. Trata-se de pinturas, esculturas, canções, dança, obras literárias e arquitetônicas. O seu sentido, no entanto, varia e em cada época há maneiras diferentes de interpretá-la. Na Antiguidade, ela era vista como imitação (mimese), no sentido de reproduzir a realidade. Mas isso não impediu que alguns filósofos criticassem essa visão. Platão, por exemplo, acreditava que a arte apenas leva à ilusão e ao engano.

Os filósofos contratualistas acreditam numa espécie de acordo que é firmado em nossa sociedade que impede a barbárie. Segundo eles, há uma contraposição entre o estado civil e o estado da natureza. Essa noção de sociedade, o estado civil é cercado por leis, regras, valores e uma falsa ideia de liberdade, apregoada pelo Liberalismo e defendida pelo Estado.  No mundo capitalista atual esse “contrato social” não foi idealizado pela gente ou para atender aos nossos interesses. Não há uma balança que pondere as injustiças ou uma força que se coloque contra elas. Vivemos numa fantasia idealizada por pessoas que querem manter os seus próprios interesses, a lógica de dominação e nada mais. Viver sobre a ilusão do sistema ou encarar a sua realidade é uma escolha.

Peço perdão pelas palavras vagas aqui. Se você, caro leitor, já jogou, acredito estar ciente do que se trata. Mas, se ainda não tiver jogado até o final, faça isso, volte aqui e releia os três parágrafos acima. Te garanto que tudo fará sentido!

Um jogo que nos faz sentir, como poucos

No fim, a ideia de vida e morte, ficção e realidade, se mesclam dentro da trama. A tragédia, suas consequências e a forma como os personagens lidam com ela, é um aspecto presente em toda a aventura. Os finais agridoces só reforçam isso. Não espere um final feliz, como nos contos de fada. A vida é resultado de nossas escolhas. É até estranho o jogo, por suas mecânicas, diálogos e level design, ser tão divertido. Clair Obscur se propõe a fazer com que o jogador reflita sobre temas sensíveis envolto a uma intensa carga dramática. É um jogo que se sente, que se vive, como poucos na indústria, atualmente.


segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O discurso reacionário de Mataphor ReFantazio

Metaphor ReFantazio se passa no reino de Euchronia. Uma terra de fantasia onde a magia é uma realidade. O mundo é dividido em oito tribos, com raças que delimitam bem cada um de seus integrantes. A injustiça e o preconceito contra certas tribos é algo corriqueiro. Nosso personagem, Will, pertence a tribo que mais sofre preconceito: os Eldas. Ele, porém, leva consigo um mundo idealizado através da história de um livro, que narra uma utopia, um mundo onde a igualdade, liberdade e justiça são uma realidade.    

A trama tem início com o protagonista e a fadinha Gallica. Os dois fazem parte de um plano que envolve livrar o príncipe de uma maldição que o colocou em um sono profundo há muitos anos. Para isso, eles precisam ou encontrar a fórmula da maldição ou eliminar o seu autor. A primeira cena do jogo mostra Louis, um prodígio na magia e chefe do Exército real, assassinando o Rei de Euchronia. Essa cena, antes mesmo da tela de abertura do jogo, nos leva a crer que a pessoa que lançou o feitiço no príncipe adormecido possa ser justamente o regicida.

Em meio a missão original de Will e Gallica, a morte do Rei, dá início a uma disputa pela sucessão ao trono. Uma magia desferida pelo Rei morto nos coloca numa trama eleitoreira. A magia lançada analisa as opções de cada habitante do reino sem a necessidade de uma declaração aberta deles. Ela enxerga os desejos dos corações de cada um. Em meio à vários candidatos, que já gozavam de certo status social e que, por isso, despontam na preferência do povo, Will entra na disputa para tentar transformar o seu sonho de liberdade e igualdade, a sua utopia, em realidade.

    

Por mais que o roteiro passe pra gente a ideia de que a pauta defendida por Will represente algo revolucionário, do ponto de vista prático, o que vemos é uma tentativa de resgate de uma realidade anterior àquele mundo segregado. É o restabelecimento de uma antiga ordem, com outra dinâmica de poder. Mas, um dinâmica de poder que ainda é segregadora. A candidata que mais aproxima sua plataforma política de algo revolucionário é Catherina. Mas, ela é apresentada para o jogador como uma extremista. Uma idealista que apresenta ideias desconexas da realidade.    


A trama de Metaphor ReFantazio é um desperdício e super reacionária. O ar de mudança que o protagonista defende se baseia na ideia de continuidade de um modelo político que preserva as diferenças de classe e a miséria de Euchronia. Numa das cenas finais, sem entrar muito em spoiler, os heróis nada fazem por um plebeu, agredido pela guarda real, que protestava contra o novo governo estabelecido. Ao final da nossa jornada, de mais de 70 horas, a impressão que fica é que lutamos por nada. Uma revolução para nada mudar.


O que é o espaço Woke Games?

Olá, amigos! Me chamo Wendel, sou professor de História e escrevo sobre joguinhos, por puro hobby, há cinco anos. Às vezes me pego pensando em como os jogos têm acompanhado a minha jornada. Jogo desde antes dos dez anos e hoje sou um homem barbado com mais de quarenta que ainda não consegue imaginar a vida sem os videogames.

Eu já escrevi de forma regular para um site chamado Jogando Casualmente e escrevo um texto ou outro, atualmente, no NintendoBoy. Mas, sempre quis ter um espaço só meu para escrever o que quiser e quando quiser. A ideia desse espaço é discutir política, representatividade, Filosofia, História e sociedade usando os videogames como inspiração. É o que uma boa parte de jogadores mais conservadores chamam de “cultura woke”. Política e joguinhos não estão, necessariamente, dissociados. Não é só entretenimento pelo entretenimento. E pensar assim é burrice, pra dizer o mínimo. Se discutir isso é ser “woke”, então, prazer, Woke Games!

Vou tentar, sempre que possível, postar uma coisa ou outra aqui sobre videogame e buscar trazer debates inéditos no meio como, por exemplo, “seriam os jogos um tipo de arte?”, “modo easy estraga os soulslike?”. Não, mentira (será?)! Espero que vocês curtam e que eu tenha disposição para sempre colar por aqui. Valeu, pessoal!

     

Jogos de guerra como ferramenta imperialista

É, no mínimo, intrigante como as mídias das mais diversas glamourizam a nossa cultura bélica. É uma temática muito presente dentro da indúst...