quarta-feira, 3 de setembro de 2025

O choro do gamer anti-woke

O início do século XX é marcado pela massificação da cultura através de veículos de comunicação, como a TV e o rádio. O sentido revolucionário da ideia de massa, defendido pela corrente marxista, ganhou uma conotação negativa. Assim, aquilo que é massificado, é uniformizado e desprovido de crítica, algo que está a serviço do sistema capitalista. Quando falamos de “cultura de massa”, portanto, estamos nos referindo a algo que não é dotado de reflexão.

Entreter ou refletir? 

O filósofo da escola de Frankfurt, Walter Banjamin, acredita que o cinema teria a capacidade de reunir divertimento e reflexão crítica, contrapondo-se à ideia de “cultura de massa”. O rótulo de videogame como arte é um fenômeno recente e ganhou contornos mais abrangentes quando suas narrativas ficaram mais “cinematográficas”. Não que os primeiros jogos não fossem dotados de narrativas ou fossem menos artísticos. Mas, os discursos presentes eram muito mais sutis. De toda forma, acredito que a lógica de Walter Benjamin pode se aplicar a essa mídia.

Nas primeiras gerações de consoles, os videogames estão muito associados à ideia de mercadorias, um produto que possui um fim bem específico: o entretenimento. Essa ideia acabou por cristalizar na mente dos jogadores um papel de mão única que os jogos deveriam cumprir. Uma mercadoria, como qualquer outra, em que a grande massa, de forma quase que uniforme, poderia consumir enquanto se entretém. É bom frisar esse “quase”, porque mesmo levando em consideração o papel mecânico e técnico do videogame - e ignorando sua narrativa e contexto - as experiências são singulares. 

Essa fase inicial representa, de certo modo, a infância desses produtos. Só que, ao longo do tempo, eles foram passando por um processo de maturação. Contando com narrativas mais complexas, abordando muitas vezes assuntos importantes, como política, representatividade, transtornos psicológicos etc. Porém, esse amadurecimento, nem sempre foi bem recebido por parte do público “gamer”. Para esses jogadores, mais vale aquela visão inicial que associava os jogos única e exclusivamente à lógica do entretenimento.

Um convite ao debate político 

Entreter, nesse sentido, é se distrair. Uma forma que encontramos de nos deslocarmos da realidade. É no ócio que, depois de um exaustivo dia de estudo ou trabalho, reabastecemos nossas energias. Isso para estarmos minimamente aptos ao nosso ofício no dia seguinte. Isso coloca o entretenimento como uma extensão do trabalho. Uma ferramenta que serve, unicamente ao sistema e a lógica de produção do mercado, já que o seu fim é nos alienar do mundo à nossa volta. 

Qualquer debate mais reflexivo sobre o papel dessas mídias, que fujam a ideia de entretenimento, não são tolerados. A palavra “Woke”, utilizada por alguns para atacar debates políticos acerca da representatividade, é, na verdade, um chamado para a pessoa “acordar” para o mundo e seus problemas. Um termo antes associado à luta da comunidade negra estadunidense, contra o racismo, mas que passou a abranger debates com vistas à consciência política e social. 

O cinismo anti-woke

A galera “anti-woke” dos videogames, ao qual carinhosamente chamo de “gamer reacionário”, são pessoas que permanecem descoladas da realidade. Eles não enxergam os problemas sociais e acreditam que há excesso desses debates dentro do campo progressista. Assim, os videogames seriam apenas um produto que tem como norte o entretenimento, não a problematização da realidade. O cômico disso tudo é que essa é uma visão cínica, porque o choro e revolta deles não é sobre o debate em si, mas sobre o que se é debatido.


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