quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Será que um dia os jogos 3D do Sonic serão, realmente, incríveis?


 Apesar de entender a importância e relevância para a indústria dos jogos 3D do Sonic, não vejo com bons olhos a transição para esse mundo. Ainda sinto saudade da simplicidade das primeiras aventuras. Do ouriço azul gordinho e silencioso e, claro, dos jogos que mesclavam de forma sublime momentos de plataforma e velocidade. 


A entrada no mundo 3D


Sonic Adventure foi um divisor de águas. O design do personagem foi retrabalhado, sintetizando o que a nova aventura se propunha a fazer. Sonic passou por uma “harmonização facial”, botou lentes verdes, pegou pesado na dieta para perder o calo na barriga e aprendeu a falar. Metade da simpatia, certa inocência e charme do personagem, pra mim, se perdeu nessa decisão estética que flertava com o “radical”.


É até estranho pensar nisso, em retrospecto, porque pra quem tem menos de vinte e cinco anos, esse é “O” Sonic. Só que o personagem das aventuras tridimensionais nunca me cativou. E a qualidade duvidosa de seus jogos 3D - em comparação às aventuras dos áureos tempos do Mega Drive - contribuiu para isso.


A ironia disso tudo é que antes os títulos de Sonic foram pensados para rivalizar com os jogos do Super Mario. E hoje em dia, Sonic rivaliza com ele mesmo. Não à toa um dos maiores sucessos recentes do personagem nos videogames foi o jogo celebração Sonic Mania, do já distante ano de 2017. Um título nostálgico que resgata toda a magia das aventuras da geração 16 bit.


Jogos tridimensionais de destaque


Se nos cinemas Sonic finalmente conseguiu alcançar o sucesso que merece, na sua mídia de origem continua “batendo cabeça”. Mesmo assim, entre muitos erros e alguns acertos, consigo destacar três jogos tridimensionais do ouriço azul que merecem atenção: Sonic Frontiers, Sonic Colors e Sonic Generations. Não são jogos incríveis, mas estão longe de “tosquices” como Sonic The Hedgehog, de 2006. 


Desses, Sonic Generations é o meu preferido. O título, lançado em 2011, originalmente, celebrava o vigésimo aniversário do personagem e uniu de um jeito bem interessante a fase 2D e 3D do ouriço, resgatando inclusive o Sonic gordinho dos primeiros jogos. A história de Generations nos permitiu revisitar estágios de diferentes momentos da franquia, apresentando fases retrabalhadas e novos mixes de composições clássicas.


Em 2024, o jogo foi relançado para os consoles atuais e adicionou o personagem Shadow na brincadeira. Uma clara jogada de marketing para promover o filme Sonic 3, que estava em vias de estrear nos cinemas. Sonic X Shadow Generations, é um divertido choque de gerações e consegue  agradar tanto fãs de longa data, quanto os mais jovens.


Na espera de um jogo, realmente, maravilhoso


De toda forma, por tudo que vi até agora e tendo crescido jogando os títulos do ouriço azul, me causa certa frustração a SEGA não conseguir emplacar um jogo, realmente, maravilhoso. Queria mais, muito mais! Não me refiro a sucesso comercial. Até porque, Sonic Frontiers é considerado, nesse sentido, um sucesso. 


Queria aquele jogo de plataforma 3D que chama atenção da galera e que deixa todo mundo de boca aberta, por tamanha beleza e criatividade. Algo que a Nintendo faz com maestria, como as aventuras de Super Mario e, mais recentemente, Donkey Kong Bananza. Queria algo épico como Psychonauts 2 e divertido como Astro Bot. Será que um dia Sonic chega lá? Sigo aqui na torcida.

terça-feira, 26 de agosto de 2025

Luto e arte em Clair Obscur: Expedition 33

Clair Obscur: Expedition 33 se tornou um fenômeno. Lançado em abril deste ano, o jogo foi uma grata surpresa. Títulos de RPG por turno, se tornaram muito nichados. E um dos grandes méritos de Clair Obscur é conseguir, justamente, furar essa bolha. Ele sintetiza e se inspira em elementos de diversos jogos existentes: um pouco de Persona, Final Fantasy, até mesmo jogos da série Souls. A equipe por trás do desenvolvimento, a Sandfall Interactive, carrega nomes experientes da indústria, que já trabalharam, em outros momentos, para grandes empresas como a Ubisoft. 

Tendo vendido mais de 3 milhões de unidades em pouco mais de um mês, é seguro dizer que Clair Obscur é um sucesso avassalador. Ele surpreendeu a todos, principalmente por não estar vinculado a uma grande publisher, apesar do investimento ter sido pesado. Mas, aqui não me interessa as entrelinhas acerca do desenvolvimento do jogo e sim o discurso presente em sua narrativa. Nesse quesito, Clair Obscur: Expedition 33 é tão brilhante quanto. A trama é envolvente e muito bem trabalhada. A trilha sonora, por sua vez, amplifica a carga emocional que o roteiro entrega para o jogador. Um espetáculo!

Morte e luto


Grosso modo, podemos enxergar dois grandes temas, que abrem o leque para outros subtemas na jornada dos heróis por Lumiére, o mundo fictício do jogo. O primeiro está presente desde o início: a morte e o luto. Como cada pessoa lida com isso? No jogo ano após ano, uma entidade, conhecida como artífice, pinta uma idade num monólito (a começar por cem) de forma regressiva. E todos aqueles com idade maior do que a pintada, desaparecem em meio a pétalas de rosas, sem dor ou sofrimento. Só deixam de existir.


Diante da morte iminente, os moradores de Lumiere passaram a organizar expedições para tentar evitar o arrebatamento, chamado por eles de “goomage”. No jogo fazemos parte da Expedição 33, que dá nome ao título. A certeza da morte iminente mudou a forma como eles encaram a própria vida. O interessante aqui é que nem todos concordam com as expedições. Mas, há respeito mútuo e cada um vive o tempo que lhes resta da melhor forma possível. Jovens amadureceram e passaram a constituir família cada vez mais cedo. E, acima de tudo, a certeza do fim os tornaram mais empáticos. Viver a  vida se tornou algo muito mais intenso porque, mais do que nunca, ela é curta.


Todos os moradores da ilha lidam com a perda de alguém que já amaram. E a dor os uniu. A ideia do luto vai ganhando mais camadas, com o avançar da história. Isso porque no início temos a perspectiva dos moradores de Lumiére. Mas, novos personagens são adicionados, quando a Expedição 33 chega ao continente, e um novo viés é apresentado. Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. De todas as fases do luto, a mais difícil, na minha opinião, é a aceitação. E existe todo um arco narrativo que demonstra o quão difícil é se acostumar com a dor da perda. E isso ronda a história do jogo até o seu desfecho.

O poder criativo da arte


O segundo tema presente no jogo é mais sutil. Trata-se do debate sobre a ideia de “arte”. Existe toda uma trama de uma família de artistas que vive no continente. Sem entregar muito das surpresas que Clair Obscur trás, é interessante a forma como podemos perceber a existência de vida na arte. Arte é um retrato da realidade, o olhar do artista sobre ela. Uma força criativa em que, diante da finitude de nossas vidas, podemos brincar de deus. Em certo momento isso entra em debate, nos fazendo questionar a noção de realidade.

Se nos debruçarmos sobre a noção de arte, veremos algo ligado à concretização de uma ideia ou a expressão de nossa própria subjetividade. Trata-se de pinturas, esculturas, canções, dança, obras literárias e arquitetônicas. O seu sentido, no entanto, varia e em cada época há maneiras diferentes de interpretá-la. Na Antiguidade, ela era vista como imitação (mimese), no sentido de reproduzir a realidade. Mas isso não impediu que alguns filósofos criticassem essa visão. Platão, por exemplo, acreditava que a arte apenas leva à ilusão e ao engano.

Os filósofos contratualistas acreditam numa espécie de acordo que é firmado em nossa sociedade que impede a barbárie. Segundo eles, há uma contraposição entre o estado civil e o estado da natureza. Essa noção de sociedade, o estado civil é cercado por leis, regras, valores e uma falsa ideia de liberdade, apregoada pelo Liberalismo e defendida pelo Estado.  No mundo capitalista atual esse “contrato social” não foi idealizado pela gente ou para atender aos nossos interesses. Não há uma balança que pondere as injustiças ou uma força que se coloque contra elas. Vivemos numa fantasia idealizada por pessoas que querem manter os seus próprios interesses, a lógica de dominação e nada mais. Viver sobre a ilusão do sistema ou encarar a sua realidade é uma escolha.

Peço perdão pelas palavras vagas aqui. Se você, caro leitor, já jogou, acredito estar ciente do que se trata. Mas, se ainda não tiver jogado até o final, faça isso, volte aqui e releia os três parágrafos acima. Te garanto que tudo fará sentido!

Um jogo que nos faz sentir, como poucos

No fim, a ideia de vida e morte, ficção e realidade, se mesclam dentro da trama. A tragédia, suas consequências e a forma como os personagens lidam com ela, é um aspecto presente em toda a aventura. Os finais agridoces só reforçam isso. Não espere um final feliz, como nos contos de fada. A vida é resultado de nossas escolhas. É até estranho o jogo, por suas mecânicas, diálogos e level design, ser tão divertido. Clair Obscur se propõe a fazer com que o jogador reflita sobre temas sensíveis envolto a uma intensa carga dramática. É um jogo que se sente, que se vive, como poucos na indústria, atualmente.


segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O discurso reacionário de Mataphor ReFantazio

Metaphor ReFantazio se passa no reino de Euchronia. Uma terra de fantasia onde a magia é uma realidade. O mundo é dividido em oito tribos, com raças que delimitam bem cada um de seus integrantes. A injustiça e o preconceito contra certas tribos é algo corriqueiro. Nosso personagem, Will, pertence a tribo que mais sofre preconceito: os Eldas. Ele, porém, leva consigo um mundo idealizado através da história de um livro, que narra uma utopia, um mundo onde a igualdade, liberdade e justiça são uma realidade.    

A trama tem início com o protagonista e a fadinha Gallica. Os dois fazem parte de um plano que envolve livrar o príncipe de uma maldição que o colocou em um sono profundo há muitos anos. Para isso, eles precisam ou encontrar a fórmula da maldição ou eliminar o seu autor. A primeira cena do jogo mostra Louis, um prodígio na magia e chefe do Exército real, assassinando o Rei de Euchronia. Essa cena, antes mesmo da tela de abertura do jogo, nos leva a crer que a pessoa que lançou o feitiço no príncipe adormecido possa ser justamente o regicida.

Em meio a missão original de Will e Gallica, a morte do Rei, dá início a uma disputa pela sucessão ao trono. Uma magia desferida pelo Rei morto nos coloca numa trama eleitoreira. A magia lançada analisa as opções de cada habitante do reino sem a necessidade de uma declaração aberta deles. Ela enxerga os desejos dos corações de cada um. Em meio à vários candidatos, que já gozavam de certo status social e que, por isso, despontam na preferência do povo, Will entra na disputa para tentar transformar o seu sonho de liberdade e igualdade, a sua utopia, em realidade.

    

Por mais que o roteiro passe pra gente a ideia de que a pauta defendida por Will represente algo revolucionário, do ponto de vista prático, o que vemos é uma tentativa de resgate de uma realidade anterior àquele mundo segregado. É o restabelecimento de uma antiga ordem, com outra dinâmica de poder. Mas, um dinâmica de poder que ainda é segregadora. A candidata que mais aproxima sua plataforma política de algo revolucionário é Catherina. Mas, ela é apresentada para o jogador como uma extremista. Uma idealista que apresenta ideias desconexas da realidade.    


A trama de Metaphor ReFantazio é um desperdício e super reacionária. O ar de mudança que o protagonista defende se baseia na ideia de continuidade de um modelo político que preserva as diferenças de classe e a miséria de Euchronia. Numa das cenas finais, sem entrar muito em spoiler, os heróis nada fazem por um plebeu, agredido pela guarda real, que protestava contra o novo governo estabelecido. Ao final da nossa jornada, de mais de 70 horas, a impressão que fica é que lutamos por nada. Uma revolução para nada mudar.


O que é o espaço Woke Games?

Olá, amigos! Me chamo Wendel, sou professor de História e escrevo sobre joguinhos, por puro hobby, há cinco anos. Às vezes me pego pensando em como os jogos têm acompanhado a minha jornada. Jogo desde antes dos dez anos e hoje sou um homem barbado com mais de quarenta que ainda não consegue imaginar a vida sem os videogames.

Eu já escrevi de forma regular para um site chamado Jogando Casualmente e escrevo um texto ou outro, atualmente, no NintendoBoy. Mas, sempre quis ter um espaço só meu para escrever o que quiser e quando quiser. A ideia desse espaço é discutir política, representatividade, Filosofia, História e sociedade usando os videogames como inspiração. É o que uma boa parte de jogadores mais conservadores chamam de “cultura woke”. Política e joguinhos não estão, necessariamente, dissociados. Não é só entretenimento pelo entretenimento. E pensar assim é burrice, pra dizer o mínimo. Se discutir isso é ser “woke”, então, prazer, Woke Games!

Vou tentar, sempre que possível, postar uma coisa ou outra aqui sobre videogame e buscar trazer debates inéditos no meio como, por exemplo, “seriam os jogos um tipo de arte?”, “modo easy estraga os soulslike?”. Não, mentira (será?)! Espero que vocês curtam e que eu tenha disposição para sempre colar por aqui. Valeu, pessoal!

     

Jogos de guerra como ferramenta imperialista

É, no mínimo, intrigante como as mídias das mais diversas glamourizam a nossa cultura bélica. É uma temática muito presente dentro da indúst...